SU:
Aquele que pensámos que seria o nosso projecto NDM durante toda a preparação em Lisboa, revelou ser, no último dia antes da partida, completamente diferente… Depois
do “pânico” inicial, podemos dizer que foi uma excelente alteração de planos para nós e esperamos que para os novos parceiros que resultaram desta alteração, também!
Assim, o grupo de Pitche e Pirada (com ficámos conhecidos pelo ISU e restantes companheiros NDM) merece ser rebaptizado para grupo Guiné! Em vez de ficarmos um mês em Pirada e outro em Pitche (como previsto), devido ao cancelamento da formação de professores que foram convocados a estarem presentes noutra formação do Ministério da Educação (retirando assim um mês de trabalho ao projecto inicial), acabámos por assegurar duas semanas de formação em Bissau, também a professores do ensino básico, no Liceu João XXIII. Desta forma, estivemos juntos com o grupo de Bissau: Margarida, Rita, Tiago e Tânia. O nosso parceiro foi também o CIEE – Comissão Inter-diocesana de Educação e Ensino e vivemos as primeiras três semanas de Guiné-bissau, na Cúria.
Enquanto nós trabalhávamos com os professores aquela que é língua oficial neste país, a língua de Camões (e também 3 dias dedicados à pedagogia da matemática), o grupo de Bissau trabalhava os mesmos temas com um grupo de futuras educadoras de infância. A vida a 7 correu muito bem entre cozinhados, limpezas, lavagem de roupa no tanque, compras na feira do Bandim, passeios a pé e de toca-toca, visitas à família da Iza (sim, temos a sorte de ter uma descendente Guineense no grupo, que fala crioulo!), conversas, risos, música e aquela que era a tarefa diária e obrigatória: a preparação da sessão do dia seguinte. Decidir os conteúdos mais pertinentes na vasta gramática portuguesa, a forma de passá-los, o tempo que iríamos dedicar a cada tema, a preocupação pedagógica e criativa, a importância da participação dos formandos… porque em qualquer formação o mais importante é a partilha de conhecimentos, experiências e amizade. E isto foi conseguido!
Sentimos grandes dificuldades na comunicação e questionámos até a pertinência de ser o português a língua oficial já que todos os guineenses falam crioulo, depois o dialecto da sua etnia e só depois a língua oficial; os professores embora “tenham” que dar as aulas em português têm imensas lacunas visto que a maioria fez o 11º ano neste “sistema de aprendizagem da língua” e depois obviamente vai dar as suas aulas de acordo com aquilo que sabe. Enfim, esta é com certeza uma matéria polémica e que envolve variadíssimas questões… mas não podíamos deixar de fazer este “desabafo”.
Temos a certeza que estas duas semanas contribuíram para relembrar aspectos importantes sobre o português e a matemática, agora só é preciso que os professores continuem a aperfeiçoar cada vez mais os seus conhecimentos e competências através de mais formações e estudo constantes. Terminámos as duas semanas de formação com poemas, música, palmas, doces e um jogo de futebol entre as duas turmas! Nesta fase despedimo-nos do nosso parceiro (cumprimentos/mantenhas para o padre Joaquim, Irmã Noeli, Irmã Dina, Irmã Lurdes e todas as outras Irmãs) e despedimo-nos do grupo de Bissau com fortes abraços e votos de continuação de bom projecto, a partir daquele momento sem nós J! Os 3 seguimos do enterramento para Gabu… mais uma excelente etapa desta “viagem”. No Sta Djunto!
IZA:
Após as primeiras três grandes semanas de Nô Djunta Mon em Bissau foi altura de partir para Gabú, onde estava a decorrer a III Escola Nacional de Voluntariado da Guiné Bissau, organizada pela RENAJ (Rede Nacional de Associações Juvenis) e onde o grupo de Pitche e Pirada iria durante uma semana dar formação.
Despedimo-nos do grupo de Bissau já com saudades.
Planos de trabalho e parceiros de projecto diferentes levavam-nos a conhecer uma outra Guiné. Chegamos à escola Luís Fona Tchuda, o local do encontro, e deparamo-nos como uma outra realidade. A nossa chegada interrompeu um dos jogos de futebol do campeonato da Escola, mas ainda assim a recepção foi calorosa. A equipa da Comissão apresentou-nos o espaço: as sete camaratas, a cozinha/ espaço para preparação das refeições, as salas de formação, a campo de futebol e o espaço reservado à bandeira do país. Todo aquele recinto escolar tinha sido devidamente preparado para o encontro.
Participavam na escola cerca de 150 jovens formandos entre os 15 e os 30 anos de idade. Havia toda uma organização que era seguida à risca por todos os participantes...éramos muitos e sentia-se essa necessidade. Havia horas para acordar e dormir, horas para as refeições, horas para as actividades desportivas e claro…para o djunbai. A Escola, pela sua organização fazia lembrar um campo de férias (em que os jovens não estavam de férias).
A par da formação que decorria de segunda a sexta durante quatro horas, a Escola tinha programado outras actividades de lazer, culturais e desportivas. Os dias na escola eram vividos de forma bastante intensa...o djunbai diário, a partilha de camas, casas de banho e refeições fazia com que todos aqueles “campistas” que conhecíamos à apenas alguns dias já fossem para nós colegas de longa data.
O grupo de Pitche e Pirada formava duas turmas diferentes: uma de saúde sexual reprodutiva e outra de associativismo, cidadania e voluntariado. Cada uma das turmas tinha cerca de 25 formandos. Como é de praxe nas formações do ISU a metodologia utilizada era a da máxima participação possível para que os jovens se sentissem envolvidos e se identificassem com a formação que integravam. A língua portuguesa era, para alguns formandos, uma barreira de comunicação, o que fazia com que nos primeiros tempos de formação alguns deles se tivessem sentido mais retraídos. A seu tempo foi sendo cumprido o objectivo da formação e no final foi possível fazer uma avaliação positiva da mesma. Pensamos ter contribuído com o nosso melhor para o cumprimento de mais um desafio deste projecto.
Foi uma experiência nova e sem duvida enriquecedora….ali víamos aquilo que de Portugal nos diziam ser o nô djunta mon.
O nosso muito obrigado à Comissão e a todos os campistas pelos momentos que nos proporcionaram.
FRANCISCO:
Em Pirada, bem no interior da Guiné-Bissau, a 10 minutos a pé da fronteira com o Senegal, terminamos agora uma experiência bem intensa: rica, mas cheia de contradições.
Na casa da ONG guineense Divutec, de onde escrevo, fomos carinhosamente acolhidos pelo Sérifo, o Ussumane e a Mariama. Aqui nos habituámos a cozinhar a carvão e a comer todos da mesma travessa, a ir buscar água ao poço e a ter um buraco no chão a fazer as vezes de casa de banho. Aqui nos refugiámos deste calor pesado e indescritível, que torna cada gesto uma epopeia. Aqui tivemos longas e divertidas conversas, bebemos warga (um chá delicioso) e conhecemos um monte de miúdos que todos os dias nos apareceram à porta (e que neste momento estão ao meu lado a ver-me escrever no bloco e a gozar comigo, imitando os todos os meus gestos).
Na primeira semana demos uma formação às parteiras e aos agentes de saúde das tabancas (aldeias) da região em educação para a saúde e nutrição. Elas e eles apareceram-nos todos os dias com longos sorrisos, uma grande calma e uma imensa vontade de aprender. E com dois enormes obstáculos: quase ninguém falava crioulo (português ninguém fala!), e quase ninguém sabe ler nem escrever. Foram cinco dias de formações traduzidas para fula (a língua local) pelo Sérifo, sem cadernos nem quadro, entre difíceis momentos expositivos e pequenos trabalhos de grupo.
Aqui, onde não chegam medicamentos ou médicos, e sobretudo não chega informação, a diarreia, a malária, a sida, a tuberculose e tantas outras doenças fazem parte do quotidiano das tabancas. Aqui, onde a formação e o nosso pequeno contributo são mais precisos, é onde eles são mais difíceis. E na mesma medida em que percebemos a importância do que cá viemos fazer, sentimo-nos largamente frustrados por todas as nossas limitações.
A segunda semana foi passada com os jovens de Pirada, para falar de cidadania, associativismo e saúde sexual e reprodutiva. De novo dois obstáculos, agora mais fáceis de contornar. Por um lado quase ninguém fala português. Graças à Iza, que fala crioulo, procurámos fazer quase toda a formação naquela que é, a existir alguma, a verdadeira língua nacional da Guiné-Bissau. Por outro lado, tínhamos quase 50 formandos. É um número muito difícil de trabalhar e foi impossível haver silêncio, mas é óptimo ver tantos jovens com vontade de aprender.
Aqui, onde as oportunidades e o emprego vêm e vão com o vento (e há muito pouco vento na Guiné), todos desejam apenas uma coisa: “Leva-me contigo para Lisboa!”. Aqui, onde não chega a educação e a informação, são poucas as hipóteses de um jovem se sentir útil e realizado, e de participar activamente na construção do país e de um futuro. Aqui em Pirada, quase 50 jovens participaram pela primeira vez numa formação. Pela primeira vez estiveram juntos desta forma, a discutir ideias. Aqui, sabemo-lo, as formações são precisas. Mas também sabemos que uma semana não basta…!
EQUIPA NDM PITCHE E PIRADA 2008
Susana Costa, Izaliana Parente e Francisco Pedro